As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 7: VII Pág. 37 / 332

- Perdoem-me as leitoras o pouco delicado da confrontação; mas bem vêem que ambos eles embriagam. É portanto lícito compará- los.

- Diz-se de certas pessoas que - têm o vinho alegre - de outras que - o têm triste - estúpido - bulhento - conforme dá a alguns a embriaguez para a hilaridade, a outros para o sentimentalismo, a outros para a modorra, ou para brigas. Pois com o amor é o mesmo. Amantes há que celebram os seus amores, e até as suas infelicidades amorosas, sempre em estilo de anacreôntica - esses têm o amor alegre; outros que, quando amam, embora sejam ardentemente correspondidos, suspiram, procuram os bosques solitários, que enchem de lamentos, e as praias desertas, onde carpem com o alcião penas imaginárias - têm estes o amor sombrio; a outros serve-lhes o amor de pretexto para espancarem ou esfaquearem quantas pessoas imaginam que podem ser-lhes rivais ou estorvos, e, nesses acessos de fúria, chegam a espancar e esfaquear o objecto amado - são os do amor bulhento e intratável; há-os que emudecem e embasbacam diante da mulher dos seus afectos, que em tudo lhe obedecem, que a seguem como o rafeiro segue o dono, e experimentam um prazer indefinível em adormecer-lhe aos pés - pertencem aos do amor impertinente e estúpido. Poderia ir muito longe esta classificação, se fosse aqui o lugar próprio para ela.

Basta porém que diga que o amor de Pedro das Dornas pertencia à primeira categoria; - tinha de facto ele o amor alegre.

Pedro cantava sempre; tudo lhe servia de tema a uma série de quadras improvisadas, de que fazia uso para alentar-se no trabalho.

É verdade que talvez isto fosse porque Pedro não tinha ainda encontrado o verdadeiro amor, aquele que, dizem, uma vez só na vida se experimenta. Em todo o caso, era o que sucedia com ele.





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