Você quer comprar-me o lameiro da azenha - não vendo.
- Eu ainda lhe não disse o que queria, tio Simeão. Olhe bem para mim. Você está a falar com um homem. Pago-lhe as dívidas, você não fica a dever nada, e eu caso com a sua marta. Pode dar os bens ao outro filho que eu não lhe quero uma de x.
- Você fala sério, ó sor Zeferino?
- Se falo sério?! Então você não sabe com quem é que trata.
- Ora bem - entendamo-nos - é a rapariga que você quer, a rapariga estreme, sem dote nem escritura?
- Eu não tenho senão uma palavra. Já lhe disse que sim.
- A rapariga é sua.
Negociara a filha com o Zeferino como tinha negociado com o tarraxa a vaca amarela na feira dos 13. Eis um caso esquisito de aldeia que pela torpeza parece acontecido numa cidade culta. Conversou-se este diálogo debaixo de um castanheiro frondoso, com um pavilhão de folhagem gorjeado de pássaros, com uns tons de luz esverdeada, na doce placidez crepuscular de uma tarde de agosto, entre dois homens de tamancos, arremangados, com os peitos cabeludos a negrejar de entre os peitilhos da camisa surrada de suor e poeira, brutos no gesto e na frase. Análogas passagens, com estilo pouco melhor, têm sido dramatizadas nas salas, entre homens da melhor polpa e casca social - uns que mandaram ensinar às filhas os verbos franceses e são assinantes do journal des dames que marca às meninas a baliza até onde pode chegar o arrojo da língua francesa e os seus mais avançados destinos. Da outra parte, homens ricos, de fígado ingurgitado, fatigados, sedentos de senhoras finas que ponham no luxo das suas salas os tons vivos da carne constelada de diamantes. É o epílogo de vinte anos de lavra dura, o substrato da compra de negras a milhares: - comprar uma branca, das que o amor pobre e o talento estéril não podem negociar.