Inferia o padre a sua conjetura, sabendo que frei João lhe mandara ler no pecador convertido, três vezes por dia, o capítulo 33, intitulado resistência às tentações contra a castidade. Fortalecia esta hipótese ter dito marta a D. Teresa que a alma de José dias lhe aparecia em sonhos; e às vezes, mesmo acordada, lhe parecia senti-lo na cama à sua beira; e então mordia o travesseiro para que o tio a não ouvisse chorar. Pode ser que estas revelações, comunicadas ao confessor, um simplório incapaz de destrinçar entre doença e pecado, fossem acompanhadas de particularidades sensitivas que marta por vergonha não contava à sua amiga. É certo que a confessada do varatojano lia, declamando, diante do seu oratório, três vezes, por dia, a resistência às tentações contra a castidade.
A oração dizia assim:
Senhor amorosíssimo, não vos escondais, não me deixeis sozinha, que me cerca o leão para me devorar; os seus rugidos me atormentam para que não goste das suavidades do vosso amor. Cercarei todo o mundo, subirei aos céus, não descansarei enquanto não achar o meu amor. Conjuro-vos, filhas de Jerusalém, criaturas da terra que, se encontrares o meu amado, lhe digais que morro de amor. E, se quereis os sinais para conhecê-lo, ouvi. O meu amado é cândido e rubicundo, escolhido entre milhares; cândido por divino, e rubicundo por humano, cândido porque inocente, e rubicundo por chagado. Ai! Doce amor, onde vos escondestes? Tende compaixão de quem vos busca. Estes sinais que de vós tenho só servem de avivar-me a saudade, são setas que me ferem; morro, desfaleço, se vos não acho.
Os cabelos da sua cabeça são como p ouro mais puro e mais precioso, são como palmitos e pretos como o corvo. Se não entendeis, filhas de Jerusalém, nem eu vo-lo saberei explicar; o que vos digo é que os seus cabelos são fortes laços que bastam para prender a todo o mundo, bastam para abrasar tudo de amor.