Chegou a um certo período que devia impressioná-lo mais pela mudança súbita que lhe transluziu no rosto. Depois dobrou vagarosamente a carta.
O Zeferino esperava a confidência do conteúdo; mas o fidalgo, apesar da nobilitação do sargento-mor, continuava a considerá-lo o pedreiro que lhe fizera os canastros e reconstruíra as paredes da cozinha. Não estava assaz bêbedo para confidências.
- Conta lá o que te aconteceu, Zeferino. - e sentando-se, meteu o saca-rolhas à botija de holanda.
O Zeferino contou tudo com muita particularidade. Descreveu a figura do rei, as barbas que metiam respeito; pausava com eles os dizeres, dando ao braço direito, com a mão aberta, um movimento compassado. Repetiu, piorados na forma, os elogios que o Sr. D. Miguel fizera ao seu amigo Cerveira; que, quando estava a escrever, perguntou se o conde de quadros tinha limos.
O fidalgo sentia muita sede. Misturava de meias a genebra com água açucarada. E ao passo que lhe sorriam as alvoradas do seu mundo fantástico, e as trevas da razão se desteciam, crescia-lhe o interesse na narrativa do pedreiro. Reperguntava pormenores já respondidos. Não havia já no seu espírito passageira sombra de dúvida. Era o seu amigo D. Miguel quem estava em são Gens de calvos; e, se ele fizera coronel o plebeu das lamelas e sargento-mor o pedreiro, foi decerto com a intenção de o obsequiar a ele, para lhe mostrar com que prazer recebera a sua carta.
- Sua majestade disse-me que estimava lá ver-me com outra carta do senhor conde, enquanto não ia lá abraçá-lo - esclareceu Zeferino.
- Tens de lá ir amanhã. Aparece cedo.
- Pronto, senhor.
- Mas, se vais para casa, passa pelos pombais e dá parte ao padre rocha que preciso falar - lhe hoje à noite ou amanhã cedo.
O padre rocha preferiu vir de manhã, antes dos transportes cívicos do tenente-coronel.