Freira, segundo o instituto, é que eu a quero. Esposa fiel do Espírito Santo. Convento austero e pobre. A riqueza das ordens monásticas é regalo de corpos e fermento de vícios... Hei de pensar ainda a este respeito. Não sei para onde irá.
- E para além do mais freira pobre! - disse D. Clementina. - O teu meio termo é violento, Leonardo! Antes Deus ma leve.
- Deus que a leve, se quiser. Por enquanto o que eu quero está dito e há de cumprir-se... Nada de lástimas, Clementina! Que queres tu? Justificas o amor da tua filha ao pintor?
- Não, mas...
- Queres ser avó dos netos do Silvestre da Fonte?
- Mas, meu Deus! - exclamou D. Clementina - nós não sabemos ainda em que ideias está a nossa filha. Esperemos que ela pense e mude de sentimentos.
- Pois sim, esperemos. Isto não vai de afogadilho. Tem trinta dias para pensar e repensar. Em todo o caso, a questão reduz-se a uma de duas: casar com o primo Carlos, ou ser freira. Uma observação: daqui até que ela se resolva, nesta casa não entra pessoa estranha. Hei de ter boas espias... Carta que eu apanhe, entra em buchas no corpo de quem a cá mandar.
- Quem há de cá mandar cartas?! - acudiu a senhora. - O Bernardo está em Coimbra...
- Está de volta para casa. Já começaram os actos. Não me faças reflexões, que eu sei sempre o que digo e porque o digo.
Retirou-se D. Clementina para poder chorar desabafadamente. Ao mesmo tempo, Norberto Calvo, sumindo-se a coberto das ramagens das faias, baixou-se a segar serradela no ervaçal.
- Estás aí, Norberto? - disse o abade à entrada do túnel.
- Saberá vossa senhoria que sim, senhor. Cheguei agora.
- Vem cá. Tenho que te dizer.
Abeirou-se o criado.
- Toma tento, homem. Não me saias do passai por este mês mais chegado, entendes?
- Sim, senhor.