algum dos seus rapazes de tentação matrimonial com alguma das filhas de coito danado! O possante lavrador, morigerado pela riqueza, já tinha dito que de má vontade daria o seu Bernardo à filha de Sebastião Pimentel, por ser prima das outras. Com quanta mais repugnância o não daria à filha de um abade!
Portanto, a saída única e desafogada em tal angústia era a fuga, enlace mais vulgar então do que hoje. Naquele tempo, o transferir judicialmente uma noiva da casa paterna para outra era coisa de costa acima, se os executores da lei tinham de tê-las com pais de sobrado alto e brasão na padieira da porta. A lei encolhia-se de medo; e as meninas, postas em extremidade, fugiam. Agora, esta coisa chamada rapto em obséquio ao pudor das voluntárias fugitivas é ave rara que vai passando à fénix dos fabulistas. Graças à pontualidade do juiz e do escrivão do bairro, hoje em dia, donzela que foge para casar não tem desculpa nenhuma, salvo se os seus espíritos romanescos a fazem desadorar vulgaridades.
Não assim a filha de Clementina Pimentel. Ricardina negou-se às insinuações de Bernardo, recusando anuir ao plano da fuga. Explicava-lhe o seu grande amor sem a ruim prova de algum acto indecoroso: queria morrer, amando-o; mas abençoada de Deus e da sua mãe. Iria para o convento, logo que o pai mandasse, e de lá; enquanto pudesse, lhe iria dando contas da sua vida.
Tão louvável resposta não demoveu Bernardo Moniz. As inferências que ele tirou alancearam-lhe coração e amor-próprio. Não há mais desconfiadas almas que as prevenidas contra o desdém da sua baixa origem. Desconfiadas e orgulhosas. Entrou-o logo a suspeita da má-fé e mal simulada astúcia de Ricardina. Arrependera-se, ou ofendera-se da proposta irreverente do plebeu; lembraram-lhe ou lembrou-se de o conhecer a guardar ovelhas; cedeu às instâncias do pai ou às seduções do primo; como quer que fosse, não o amava.