Tem um ano de noviciado. Espero que não chegue a professar. O caso lá muda de figura.
- Não chegará a professar, não... Morrerá antes...
- Deus se compadeça da sua alma. Antes a quero morta que mulher do filho do Silvestre da Fonte. Os mortos não envergonham os vivos...
- Despedaçam-nos com saudades - atalhou D. Clementina.
- Quando os vivos têm poucos brios.
- Os brios... os brios... - disse ela sorrindo tristemente.
- Sim, os brios! Que tem?
- Os brios de mãe... não o coração, Leonardo.
- E a darem-lhe com o coração!... Querem governar o mundo com o coração!... A cabeça já passou de moda!... Pois, senhora, eu tenho cá uma regra invariável... Filha desobediente perde o direito à estima dos seus pais.
- E não perde pouco... Perdi-a eu... e sei quanto perdi...
- Pois por isso mesmo - recalcitrou rudemente o desavergonhado abade - , por isso mesmo. Vives mal? Estás arrependida? Mais uma razão para que enfreies as liberdades da tua filha; que não vá acontecer igualar-se contigo na sorte.
- Deus a mate! - exclamou a senhora, afogada de soluços.
- Está bom! Está bom! - rezingou o padre. - Nada de choradeiras intempestivas. O mal feito fez-se; o mal possível prevê-se e remedeia-se: é o que eu faço.
- Bem! - disse serenamente D. Clementina, sopeando a dor. - Queres que eu a previna?
- Está claro. Amanhã chega a liteira; depois de amanhã faz jornada.
- Quem vai com ela?
- Tu e dois criados. Lá estão em Lamego os meus primos encarregados de a receber e levar ao convento.
- Não me dispensas de ir a mim?
- Não. É necessário. Quem há de ir? Bem sabes que não conhecemos senhora nenhuma no caso.
- Mas eu não posso suportar a dor da separação! Como hei de eu despedir-me da minha filha?!
- Aí tornas tu com lástimas de carpideira! Forte zanga! As mulheres parece que trazem as lágrimas numa bilha!
- Deixa-me chorar, Leonardo! - clamou ela pondo as mãos.