O Retrato de Ricardina - Cap. 9: CAPÍTULO IX - ATÉ QUE ENFIM! Pág. 55 / 178

Por terceiras pessoas de segura confiança aluga a mais apropositada vivenda à orla esquerda do Mondego. As árvores estão nuas e tristes, o rio vai torvo, as aves não cantam quando o céu está em luto. Aquilo é inspirativo de fastio e amargura; mas o seu delírio deleitou-lhe magicamente o que dias antes lhe pareceria estância de degredo. Não há senão dois criadores: Deus e o amor.

Mobilado o prédio com as melhores alfaias que um, seu confidente escolheu, partiu para a quinta suburbana de Lamego. Ao mesmo tempo eram avisadas a irmã do académico e Ricardina. A noviça esperava algum lance arrojado; mas muito aquém da temeridade realizada. Trespassou-a frio e febre de medo. Queria ofender-se da precipitação do passo, e mandá-lo sair de tão perto do convento; mas o coração reprovava as demasias de tão severa prudência. Propriamente a freira se admirava do hiperbólico juízo da sua amiga, malsinando-lhe de ingratidão caprichosa o desamor com que respondia aos tratos do pobre jovem. E a falar verdade, Ricardina gostava de ser repreendida para se ir compenetrando do pesar de ingrata.

Graças ao poder da sensibilidade, respondeu cordialmente a noviça ao ditoso Bernardo; todavia não se dispensou de lhe reprovar a vinda intempestiva, segurando-lhe que somente fugiria na extrema certeza de ser levada do convento para casar com o primo. A condição verificou-se depressa. Anunciou-lhe o pai, irritado pelo silêncio dela, que se, preparasse para sair no prazo de oito dias. O remate da carta merece traslado: “Quero castigar tua irmã mostrando-lhe que és mais rica e feliz que ela. Hei de comprar-te um palacete em Viseu, e dar-te sege. Passarás com o teu marido lá o Inverno, e eu, que hei de brevemente ser nomeado deão da Sé, irei também para lá. Faz-me a vontade sem me desconsolar com as tuas criancices; que tu me dirás ainda que és a mulher mais afortunada do mundo.





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