Mas, com aquela superioridade de crítica que têm os que, seja qual for o empenho, se mantêm de pé atrás, Rodolphe descobriu naquele amor gows a explorar. Julgou incómoda toda a espécie de pudor. Passou a tratá-la sem qualquer respeito. Fez dela uma coisa maleável e corrupta. Era uma espécie de apego idiota cheio de admiração por ele, de voluptuosidade para ela, uma felicidade que a entorpecia; afundava-se-lhe a alma nesta embriaguez e nela se afogava, engelhada, como o duque de Clarence no seu tonel de malvasia.
Só por efeito dos seus hábitos amorosos, a Sr. Bovary mudou de maneiras. O seu olhar tornou-se mais atrevido e a sua conversação mais livre; cometeu até a inconveniência de passear com o Sr. Rodolphe, de cigarro na boca, como que para caçoar das pessoas; enfim, os que ainda duvidavam deixaram de ter dúvidas quando ela foi vista, um dia, descer da Andorinha, de corpo cingido por um colete, como os homens; e a própria sogra, que, depois de uma terrível cena com o marido, se viera refugiar em casa do filho, não foi a senhora menos escandalizada. Muitas outras coisas lhe desagradaram: primeiramente, Charles não dera ouvidos aos seus conselhos sobre a proibição dos romances; depois, também não lhe agradava o género da casa; tomou a liberdade de fazer observações e houve zanga, sobretudo uma vez, por causa de Félicité.
A mãe do Dr. Bovary, na véspera à noite, ao atravessar o corredor, surpreendera-a na companhia de um homem, um sujeito de colarinho escuro, de cerca de quarenta anos e que, ao ruído dos passos dela, se escapara rapidamente da cozinha. Então, Emma desatou a rir, mas a boa senhora exaltou-se, declarando que, salvo querendo escarnecer dos bons costumes, devia vigiar os hábitos dos criados.