Uma enorme algazarra irrompeu na sala, subiu em crescendo, com gritos estridentes (uivava-se, ladrava-se, batia-se com os pés, repetia-se: Charbovari! Charbovari!), depois rolou em notas isoladas, acalmando-se com grande dificuldade e recomeçando subitamente, de vez em quando, numa fila, como uma bomba mal extinta, algum riso sufocado.
Entretanto, à força de ameaças de castigos, a ordem restabeleceu-se a pouco e pouco na classe e o professor, tendo conseguido perceber o nome de Charles Bovary, depois de o ter feito ditar, soletrar e reler, intimou logo o pobre diabo a ir sentar-se no banco dos cábulas, em cima do estrado. Ele começou a mexer-se, mas, antes de dar um passo, hesitou.
- Que procura? - indagou o professor.
- O meu bo... - Disse timidamente o caloiro, olhando à sua volta com uma expressão preocupada.
- Quinhentos versos para toda a classe! - exclamou furiosamente o professor, detendo, como o quos ego, uma nova borrasca. - Fiquem lá quietos! - continuou, indignado, o professor, limpando a testa com um lenço que acabava de tirar do seu gorro - e você, seu caloiro, vai-me copiar vinte vezes o verbo ridículos sumo.
Depois, com uma voz mais branda:
- Deixe lá, o seu boné vai aparecer; ninguém lho roubou!
Tudo voltou a acalmar-se. As cabeças inclinaram-se sobre as pastas e o caloiro ficou duas horas numa atitude exemplar, embora tendo havido, uma vez ou outra, alguma bolinha de papel que, atirada com o bico de uma pena; lhe veio acertar na cara. Mas ele limpava-se com a mão e continuava imóvel, de olhos baixos.
À noite, na sala de estudo, tirou da carteira as mangas de alpaca, arrumou as suas coisas e traçou cuidadosamente as linhas do papel. Vimo-lo a trabalhar conscienciosamente, procurando todas as palavras no dicionário e esforçando-se bastante.