Fernando chegou, retiro-me para me não tornar importuno.
- Isso é graça, rapaz! - respondeu Fernando, parecendo perceber o verdadeiro sentido daquelas palavras. - Deixa-te estar à vontade; creio que tanto eu, como tu, ou como outro qualquer, tem direito a captar as boas graças da pérola desta aldeia; quem ficar vencedor na contenda, que seja feliz, porque eu, pela minha parte, não me zango com isso.
- Tem razão, Sr. Fernando; gosto de o ouvir assim falar; mas do que deve estar certo é que eu nunca tal tentei nem tentarei, e para prova ela que o diga. É certo que entre nós existia de há muito uma certa amizade...
- Amizade?!... - interrompeu o rapaz, fitando o rosto impassível e sereno de Rosa.
- Sim, uma amizade livre de qualquer ambição... uma amizade de irmãos, de crianças...
- És já mais feliz do que eu, António: as afeições que se conseguem nos primeiros anos da mocidade são ardentes, sinceras...
- Engana-se, Sr. Fernando: essas afeições duram apenas até uma certa idade, até ao dia em que se não conhece no mundo outro ente mais caro, ou se não ouvem juramentos mais acreditáveis, mas menos verdadeiros que as simples declarações que se trocam durante esses primeiros dias de inocentes enlevos. Muitas vezes, Sr. Fernando, a mulher que acompanhámos nos primeiros alvores da vida, e que parecia querer-nos tanto, chega a detestar-nos, a aborrecer-nos do íntimo da alma, desde que uma nova afeição lhe nasceu no peito.
Ao que parece, achas-te ferido desse mal, não é verdade? Ora vamos: sê franco e explica-te mais claramente; parece-me ver uma segunda intenção nas tuas palavras...
- Pois bem! Quer que seja franco? Aí vai tudo sem rodeios. O Sr. Fernando é namorado de Rosa e ela ama-o tão cegamente que quase chega a aborrecer todas as pessoas que dantes lhe mereciam alguma consideração e confiança; eu conto-me no número dos queixosos.