As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 29: XXIX Pág. 205 / 332

A festa mudou súbita e completamente de carácter.

À exclamação do lavrador respondeu grande alarido na assembleia.

De todos os lados se pedia o cumprimento da lei das esfolhadas.

Cabia pois a José das Dornas fazer a primeira distribuição de abraços.

O alegre lavrador não se fez rogar.

Seguiu-se então um espectáculo eminentemente cómico. José das Dornas ergueu-se do lugar onde estava, para correr, um por um, todos os outros, com profusão de abraços, dar o exemplo de observância à lei reguladora da festa.

Todo este cerimonial foi acompanhado das gargalhadas dos espectadores e entremeado de observações jocosas do oficiante, o qual fazia valer sobremaneira o acto, graças ao génio folgazão que Deus lhe dera.

A cada rapariga que abraçava, José das Dornas, prolongando mais o abraço, dizia com visagens e gestos, que faziam estalar de riso os circunstantes:

- Na minha idade, aos sessenta anos, só o milho-rei me podia dar destas fortunas! Ainda bem que a sorte mo trouxe às mãos.

Ao abraçar os homens, exclamava ele, com certo ar de desconsolação, comicamente expressivo:

- Que belo abraço desperdicei agora!

Passando pelos filhos, abraçou-os, dizendo-lhes:

- Rapazes, tenham paciência. Eu sei que não são destes abraços que vós quereis. Mas é lei, é lei. Os outros virão a seu tempo.

A um criado, disse, meneando a cabeça:

- Ah! maroto! Ser obrigado a abraçar-te, quando tanta vontade tinha de te apalpar de outra maneira as costas! Ora vá, que talvez te não gabes doutra.

O certo é que, depois disto, começou a animar-se a esfolhada.

As espigas vermelhas, como se atraídas pelo bom acolhimento feito à primeira, apareceram sucessivamente em diferentes mãos, e cada uma, que aparecia, dava lugar a episódios graciosos e a prolongada hilaridade.





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