As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 32: XXXII Pág. 228 / 332

- Não, não o entendo, porque não posso... porque não quero...

porque não devo acreditar na verdade, do que me parece entender.

- E quando lhe falei eu assim, diz-me?

- Um dia, começava a falar-me desse modo em casa daquele doente que foi ver. De outra vez... - Oh! e dessa!... - foi naquela noite da esfolhada, em casa de seu pai.

- E não me entendeu nessa noite?

- E queria que o entendesse?

- Pois não deve ser o desejo de quem fala? - perguntou Daniel, com modo jovial.

- Eu ouço dizer que há muitas pessoas que falam a dormir; quanto dariam esses por não serem entendidos então?

- Mas eu nunca fui sonâmbulo, Clarinha.

- Tanto pior para si.

- Porquê?

- Porque então é mau.

- Mau!

- Mau, sim. Eu não sei de maior maldade do que a daqueles que andam por aí a inquietar o sossego das famílias, a alegria dos corações, e só por gosto de fazer infelizes.

- Então eu...

- Basta, Sr. Daniel. Se é homem de bem, retire-se ou deixe-me retirar - disse Clara, com um ar de serenidade e nobreza, que o impressionou.

Dando também às suas palavras mais grave tom, Daniel respondeu:

- Escute, Clara. Acredite que não fala com um homem de sentimentos perdidos; escute-me, e tranquilize-se. Eu reconheço em mim um princípio mau, é verdade; mas creia que lhe não ando tão sujeito, que nem compreenda já a força dos meus deveres. Concedame ainda um pouco de consciência. Às vezes, muitas vezes até, deixo-me arrastar por esta força, que me leva a loucuras, que chega talvez a aproximar-me duma vileza... mas, ao chegar aí, até hoje tenho resistido, e espero... Perdoem-me isto, por quem são. Cedo me verão arrependido.

- Cedo! e quando é cedo ou tarde? sabe-o lá! Quem lhe há-de dizer que é cedo? cedo para si, poderá ser; e para os outros, também?

Há poucos dias, que todos por aí falavam duma pobre rapariga, a quem, por divertimento, o Sr.





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