Daniel trazia quase doida.
Está arrependido, não é verdade? Mas arrependeu-se cedo para ela? Amanhã poderiam dizer de mim...
- Que hão-de dizer, Clarinha? Essa rapariga, de que fala, não fui eu que a fiz doida; engana-se; encontrei-a já assim. Eu não trabalhei para a perder; também se engana; os seus é que se esforçaram por a darem por perdida. A Clarinha esquece que, a si, todos a respeitam e que...
- Não é assim. Em que sou eu mais do que as outras? Ninguém está acima das vozes do mundo. E se até agora tinha razão para não me importar com elas, por não me julgar culpada; teria de as temer, se continuasse a ouvi-lo aqui. Adeus.
- Vejo que me enganava ainda ontem, dizendo-me que tinha confiança em mim. Esses receios...
- Enganaria; mas enganava-me a mim mesma também. Eu não sei mentir. E a prova é que, sinceramente lhe digo agora, que desconfio.
- De mim?!
- De si, sim; porque não? As suas acções não são leais. Vê que, vindo procurar-me aqui, me pode perder e não se importa fazê-lo; peço- -lhe que se retire, e teima em ficar; peço-lhe que me deixe retirar, e impede-mo. Brinca assim com a minha reputação, sem se lembrar que sou quase já a mulher de seu irmão, quase a filha de seu pai, quase sua irmã também. Diz que sabe quais são os seus deveres... e como é que os cumpre então? Se Pedro passasse por si, neste momento, e lhe abrisse os braços, como a irmão que é, teria valor para o abraçar, diga?
Não fugiria antes dele como um criminoso? Fale.
Daniel curvava a cabeça, sem coragem para responder.
Clara prosseguiu:
- Peço-lhe, pela alma de sua mãe, que nunca mais me procure aqui, que nunca mais me procure em parte nenhuma. Ontem ainda me ri eu dos avisos que recebia para me acautelar; hoje, já não sinto vontade de me rir.