O Retrato de Ricardina - Cap. 16: CAPÍTULO XVI - E O SOL NASCIA FORMOSO! Pág. 110 / 178

- Mataram o Bernardo? Que disse aí, primo?... Mataram-no?

- É o que me contou agora um criado que vem de lá - respondeu placidamente Luís.

Ricardina expediu, uns após outros, espantosos gritos, sem palavra articulada. Remessava-se de ímpeto contra as portadas da janela, impulsada pelo intento do suicídio. Retrocedia repuxada por Eugénia, cujos braços cediam ao debater-se frenético da irmã. Luís Pimentel, mais cauto que condoído, pedia-lhe que não desse tamanhos brados. A infeliz não dava tento da observação: sobrava-lhe infernos para que na sua alma não coubesse mais aquele espicaçar afrontoso do bárbaro que a mandava sufocar os gritos. Eugénia fitava o marido com reprovador silêncio, quando ele trejeitava em sinal de aborrecido de tais lástimas. Sebastião Pimentel bufava de raivoso contra a vergonha de se estar carpindo na sua casa a envilecida amante de Bernardo Moniz, do filho de Silvestre da Fonte, do antigo pastor de cabras... que lhe rejeitara sua filha Matilde.

Quem não viu, nem quis ver Ricardina, foi Carlos Pimentel, o noivo repelido. Ouvia-lhe os clamores, e fechava os ouvidos para não lhos ouvir. É que na sua alma, onde uma vez se abrira a imagem de Ricardina, sombra de outra imagem, não pudera ainda delir-se-lhe a saudade.

Caiu alfim sucumbida. Já não se lhe ouviam sequer os soluços. Devia de estar exulcerado aquele seio que espirara fogo. Caiu aos pés da irmã, que a não pôde amparar no baque. Levantaram-na sem acordo. As faces estavam frias; mas as lágrimas deslizavam ardentes do rescaldado sangue que lhe arfava nas veias do colo.

- E se ela morria... - exclamou Eugénia lavada em lágrimas.

- Era uma felicidade para ela e para nós - disse de si consigo Luís Pimentel.

Desculpe-se-lhe o mental solilóquio.





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