- Vocês já se ergueram?! - perguntou ele espantado.
- Ainda nos não deitámos - respondeu o médico fundamente triste.
- Que tens? - disse Bernardo Moniz. - Porque mandaram chamar-me!?... Vocês estão fúnebres! Esperam ser riscados? Isso que faz? Precisaremos nós do grau de bacharéis para viver?
- Estás longe de compreender a nossa agonia - disse o teólogo.
- Fala, homem! Histórias do abade?
- Não. Sabê-lo-ias, se cá tivesses passado esta noite, a mais horrorosa que ainda tivemos.
- Vocês?!
- Sim... Sabias que nos reuníamos esta noite por causa da deputação?
- Sim, sabia...
- O Mateus e o Figueiredo foram votados à morte.
- Era de esperar essa rapaziada - objetou Bernardo. - E vocês não se opuseram?
- Quisemos; mas sufocou-nos a maioria.
- É uma tolice que não pode ir avante - volveu o jurista. - Na primeira reunião irei falar.
- Vais tarde, Bernardo. Os lentes foram condenados a morrer no caminho de Lisboa.
- É horrível; mas então!... Vocês definham-se por Isso?... Provavelmente hão de tirar-se à sorte os executores... É isso que vos aterra? São duzentos os sorteados...
- Já se tiraram...
- Quantos?
- Treze.
- Quem saiu? Algum de vocês!? - perguntou impetuosamente Bernardo.
Calaram-se os irmãos, olhando um no outro com os olhos húmidos. Bernardo levou as mãos ao seio onde sentira o trespassar de uma lança. Tinha lido a resposta nas lágrimas dos irmãos. Avançou de salto para eles; olhou-os muito de frente, e desafogou estas vozes roucas:
- Sou eu um dos sorteados?
- És - conclamaram os irmãos, abraçando-o.