As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 36: XXXVI Pág. 258 / 332

Venha comigo.

- Sr. Reitor, não se ocupe de mim. Repare que está falando com um miserável. Não creia que me pode regenerar pelo arrependimento.

Eu sou relapso. A minha alma fraca sabe sentir, mas não sabe vencer-se. Sabe sentir, disse eu? Nem isso. Em mim já se apagou todo o sentimento moral.

- Não diga blasfémias. Filho, não descreia assim. A fé é o primeiro passo para a regeneração de que fala.

- A fé? Agora?... Tenho-a na quietação da morte.

E outra vez fitou a vista na torrente.

- Chama quietação à morte? Engana-se; depois dela é que principia muitas vezes o maior movimento, o movimento sem fim, sem remissão, o eterno. Mas oiça, Daniel; eu concebo o desespero do seu coração neste momento. Pesa-lhe o que fez? Tanto melhor.

Não o quisera ver tão endurecido, que dormisse tranquilo depois das cenas desta noite. Sente doloroso o pungir dos remorsos; pois é essa a porta aberta à expiação.

- Remorsos! E daqueles que só acabarão, quando este amaldiçoado coração deixar de bater.

- Que durem como preservativo de novas loucuras, e não virá mal daí. Mas escute: julga haver destruído o futuro de seu irmão, imagina que lhe espremeu a esponja do fel no copo, que o pobre moço preparava para levar aos lábios? E assim esteve para ser; e, se fosse, também eu não sei que vida se prepararia para esse seu coração incorrigível. Mas tranquilize-se; Deus foi misericordioso; enviou um dos seus anjos protectores. Tudo está salvo.

- Salvo?! Que salvação pode haver para mim? Como desviar a desgraça iminente sobre as cabeças deles?

- Então não lho estou eu a dizer? Esquece-se das asas do anjo?

Clara foi protegida por elas. Pedro ignora que fosse a noiva dele a que esteve no jardim a noite passada.

- Não queira iludir-me; Pedro surpreendeu-me quando.





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