As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 40: XL Pág. 296 / 332

XL

A tarde desse dia empregou-a o reitor em casa de José das Dornas, onde, com a sua diplomacia, conseguiu evitar as dificuldades da primeira entrevista entre os dois irmãos.

Pedro, cheio de remorsos, abraçava Daniel, e este, que com mais razão os estava sentindo, a custo podia suportar essas provas de arrependimento de uma culpa imaginária.

Repugnava-lhe afectar maneiras de quem perdoa, quando força interior o impelia a ajoelhar, e a confessar-se culpado. Por mais de uma vez esteve para revelar tudo; susteve-o o olhar que o reitor, pressentindo esta tentação, nunca dele desviava.

- Mas - dizia Pedro, já em ponto adiantado da entrevista - se tu gostas da Margarida, porque não hás-de casar com ela?

- E julgas que ela consentiria? - perguntou Daniel.

- Porque não? Não te estima também? Eu julgo que bem claro to mostrou ainda ontem.

Daniel achava-se embaraçado. A observação do irmão era, na aparência, tão razoável, que ele não sabia o que havia de responder.

Valeu aqui a táctica do reitor.

- Ora que sabes tu dos outros, Pedro? - disse ele. - Tem graça! Cada um sabe de si, e é quando Deus quer, que, às vezes, nem de nós sabemos também. O melhor é falarmos em outra coisa, ou tratar cada qual da sua vida.

Daniel da melhor vontade seguiu o conselho do reitor, e a conferência terminou.

Porém, quando o padre ia a transpor o limiar da porta da rua, Daniel aproximou-se dele.

- E Margarida? - perguntou-lhe com certa ansiedade.

- Margarida? Margarida está boa.

- Falou-lhe depois que hoje nos apartámos?

- Falei.

- E persiste na sua resolução?

- Que resolução?... Na de salvar a irmã?... pois está de ver que sim.

- Não falo disso.

- Então? - perguntou o reitor, com afectada simplicidade.





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