As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 18: XVIII Pág. 121 / 332

Ande lá, ande lá, que, enquanto não cair deveras doente, não há-de escarmentar, já vejo.

- Mas, mulher, não viu o que eu disse àquele criado?

- Deixe lá. Daqui até casa tem ele de parar em mais de quatro tabernas e de se demorar meia hora em cada uma, pelo menos.

Verá que há-de ainda chegar primeiro do que ele. Vamos, vamos. É jantar.

- Se eu nem mandei desaparelhar a égua!

- Alguém teve esse cuidado. Ande, que o caldo arrefece.

- E aquelas senhoras que têm pressa?

- Ora adeus! Ainda não conhece aquela gente? Fervem em pouca água. Sempre assim foram. Afinal verá que não há-de passar de uma enxaqueca da D. Leocádia, algum flato da pequena, ou uma indigestão do procurador; e ainda acredita naquilo?

Evidentemente, João Semana ia-se deixando convencer. Aproximara- se pouco a pouco da cadeira, hesitando ainda na aparência, mas no íntimo resolvido já.

Ia enfim a sentar-se, quando a criada o interpelou de novo, exclamando:

- Então que é isso? Assim mesmo como está? Nem muda de fato?

- Para quê?... não estou com tantos vagares...

- Não, então, se é para comer de afogadilho, mais vale fazer primeiro a visita. Assim nem lhe presta o que come. Eu guardo o jantar então, visto isso.

Joana, era o nome da criada, bem sabia que tal proposta não podia já ser recebida por João Semana, cujo apetite se irritara com as exalações da sopa; foi a razão pela qual ela se mostrou tão pronta em reunir a acção às palavras, retirando da mesa o serviço.

O êxito desta táctica foi completo.

João Semana impediu-a, dizendo:

- Deixe ficar, já agora deixe ficar. Também para me vestir não é preciso muito tempo.

E, depois destas palavras, descalçou-se, enfiou os pés em umas chinelas, que tinham sido botas, pôs-se sem cerimónia em mangas de camisa, sentou-se à mesa e rompeu um ataque em forma contra a volumosa e apetrechada tigela que tinha defronte de si.





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