a turba, muitas raparigas a rirem dos atores vestidos de mulheres, e uns rapazes com chalaças de uma graça aparvalhada, muito local, a que os do palco respondiam à letra com manguitos, e os que faziam de mulheres batiam palmadas no traseiro, voltando-o para o público. Cães ladravam às figuras; os rapazes davam-lhes pauladas e eles ganiam. As velhas mandavam calar o gentio para poderem perceber as faias: - canalha brava, calai-vos aí! - uma balbúrdia que parecia um teatro de cidade de primeira ordem. O tio Gonçalves, o dono da eira, dizia que estavam todos bêbedos, e voltava-se para o desconhecido, como a pedir desculpa.
- É entrudo - dizia - é entrudo, senhor!
Quando apareceu o padre na cancela da eira, houve silêncio com algumas fungadelas de riso das cachopas, e recomeçou a comédia em obséquio ao abade e à arte ultrajada pela hilaridade bruta da plateia. Notaram alguns velhos sisudos que o forasteiro das grandes barbas se mantivera muito sério durante a troça da canalha. Assim o dizia o Gonçalves ao abade, perguntando-lhe se conhecia aquele senhor.
- Não conheço - e acotovelava o nunes, segredando-lhe com o disfarce:
- Você adivinhou. É ele.
- Que me diz, abade?
- É ele.
O veríssimo dera três passos para acender um cigarro no de um músico que estava sentado num bombo.
- E ele! - repetiu o abade. - você não o viu coxear?
- Fale baixo, fale baixo, e não olhe muito para ele, que eu já o vi deitar-nos os olhos - acautelou o nunes.
- Também eu...
Estalou neste momento uma gargalhada geral. Veríssimo também se riu, e deu palmas.
- Olha! Olha! A dar palmas! - notou o abade com transporte. Aquilo sensibilizou-o até às lágrimas! O Sr. D. Miguel I a dar palmas às figuras do médico fingido, na eira do Gonçalves, em são Gens de calvos! Tocante!
A risada geral, as palmas e os apupos não eram figorosamente uma ovação ao autor do entremez nem aos curiosos.