Eis o caso. Na cena I o Astolfo pede carinhosamente à filha que coma alguma coisa. Matilde diz que não pode, que não está em si; que lhe acuda, que lhe acuda, porque um suor frio lhe faz perder os sentidos.
O gargajola esperava ser amparado pelo outro, em harmonia com a rubrica que diz: finge desmaio, e Astolfo a sustém nos braços. Mas ou porque se antecipasse a desmaiar, ou porque Astolfo se demorasse a ampará-la, Matilde escorregou de costas sobre o barro ainda fresco do palco; e, no acto de se erguer debaixo dos apupos da multidão, arregaçaram-se-lhe as saias e saiotes até à cintura. Ora a Matilde não usava calcinhas. Um escândalo.
Veríssimo Borges não pôde sustentar a gravidade competente à sua pessoa. A natureza rebentou por de fora numas casquinadas convulsas que poderiam custar-lhe uma mocada, se a deflagração do riso não fosse geral.
Matilde fugiu do palco, enfiou pelo palheiro e não voltou à cena. O ensaiador, o trolha, saiu ao terreiro a explicar ao público a suspensão do entremez nestas palavras:
- Aquele alma do diabo despiu a farpela, e diz que raios o parta, se cá tornar, vocês pode ir à sua vida que não há hoje teatro.
Começou a debandar o auditório em grande algazarra. Veríssimo parecia esperar que o galã, o relhas júnior, se despisse para se retirar. O Gonçalves perguntava-lhe:
- E que tal esteve a chalaça, senhor? Má mês pró homem, que se mais tivesse mais punha ó léu! - e voltando-se para o abade, que, a pedido do nunes, guardava respeitosa distância: - Ó senhor abade! Coisa assim não consta! Eu, se me sucedesse uma daquelas, metia a cabeça num fole.
- São acasos - disse veríssimo com indulgência. - não se lembrou que estava vestido de senhora.
O abade ganhou ânimo, abeirou-se do Gonçalves, cumprimentando o outro cerimoniosamente, e disse:
- O entremez não presta para nada.