Mas as cartas quem lhas redigia era o mano frade, recheando-as de trechos de política de púlpito - resultado das suas digestões morosas, contemplativas - que serviram de ornamento nas colunas do Portugal velho!, periódico miguelista da época festejava dispendiosamente os natalícios do rei, naquele ano, por meado de 1845, espalhara-se no ambiente dos realistas, como um aroma de jardins floridos, o boato de que vinha o Sr. D. Miguel. O seu enorme partido sentia-se palpitar no anseio daqueles vagos anelos que estremeciam as nações pagãs ao avizinhar-se o profetizado aparecimento do messias. Afirmam-no os santos padres, e os padres do Minho asseveravam o mesmo a respeito do príncipe proscrito. Frei Gervásio recebia do alto da província cartas misteriosas de uns padres que paroquiavam na póvoa de Lanhoso e vieira. Era ali o foco latente do apostolado. Naqueles estábulos de ignorância supersticiosa é que devia aparecer, pelos modos, o presépio do novo redentor. Citavam-se profecias apocalípticas de frades que estavam inteiros sob as lajes das claustras. Convergiam àquele ponto missionários de aspetos seráficos, olhando para as estrelas como os magos e os pastores da palestina. O frade mostrava as cartas ao irmão e dizia - lhe: “ele há coisa...”
- Mas muito grande! - corroborava o major com cabeçadas afirmativas muito exageradas.
- A Rússia move-se, é o que é - afirmou frei Gervásio, correlacionando a iniciativa de Lanhoso com a propaganda autocrática da Rússia.
Num destes diálogos, em que havia desabafos, exuberâncias de júbilo, interveio o Zeferino das lamelas, o pedreiro afilhado do major. Vinha contar o caso do Simeão de Prazins e a pega que teve com os cães do dias de Vilalva. Mostrava a calça remendada - que por pouco lhe não entravam no couro os cães - dizia, e protestava vingar-se.