Quando o Cerveira lhe perguntou: - que tal? O que dizia ele? - dobrava a carta vagarosamente, encolhia os ombros e respondia:
- Enfim... Não sei...
- Não sabe o quê? Lá que eu lhe levo o dinheiro, isso levo. Pudera não! Tudo o que eu tiver até à camisa do como. Ou se é amigo ou não se é amigo, hem? Que diz a isto, padre?
- Se quem escreveu esta carta é o Sr. D. Miguel, faz v. Exa o que deve, porque faz o que pode; mas seria bom ter a certeza...
- De que é o rei que me escreve?
- Sim.. A prudência... Há muito maroto por esse mundo.
- O padre está então a ler! Cuida que eu lhe dava o meu dinheiro sem o ver? Hei de vê-lo com estes, e ouvi-lo falar primeiro. Mas deixe-se de asneiras, padre rocha! É tão certo deus estar no céu como ele estar em calvos.
- Bem! - atalhou o rocha apressado, erguendo-se - quando vai v. Exa a calvos?
- Hoje é terça-feira; a roupa chega de braga na sexta, e parto no sábado. Ora agora, vou lá mandar o Zeferino a dizer-lhe que vou beijar-lhe a mão e levar-me os três contos. Se faz favor, escreva-me aí duas linhas, só duas linhas, a dizer isto.
O padre escreveu, e saiu muito preocupado. Celebrou a missa a D. Andresa, e pediu-lhe licença para se ausentar por três dias. Relatou à fidalga as suas desconfianças, o dever que se impunha de salvar o pobre idiota de alguma cilada à sua imbecilidade, e talvez de um roubo à mão armada.
- Mas quem sabe se é na verdade o D. Miguel que lhe pede o dinheiro? - refletia D. Andresa, discreta e sensibilizada.
- É o que eu vou saber.