Em Oviedo o encontrou Norberto dirigido pelas informações do espanhol, a cujos parentes Bernardo fora recomendado.
- Ricardina?! Vens sem ela, meu amigo?! - exclamou o foragido.
Norberto encarou-o com a cabeça altiva, e disse vigorosamente:
- Vossa Senhoria é homem?
- Se sou homem! Porque me fazes semelhante pergunta?
- Tem ânimo?
- Tenho!... Que vais dizer-me?
- Olhe lá! Eu gosto de um homem, que este, ainda que todos os diabos do Inferno se levantem contra ele, não dê de si! Nas ocasiões é que se mostra quem vai coa cara para diante, e não há nada que o faça ir a terra!
- Conta comigo para tudo, Norberto! - disse Bernardo entusiasticamente, persuadido da precisão de algum arriscado arrojo a fim de tirar Ricardina das presas do pai. - É necessário voltar a Portugal?
- Deus nos guarde disso! - atalhou o Calvo. - Se o lá pilhassem, enforcavam-no!
- Então que é?
- Que é, Sr. Doutor? É que a Sr.ª D. Ricardina...
- Que é?
- Morreu.
- Quê? - bradou Bernardo apertando as fontes com as mãos convulsivas, e oscilando nas pernas, que fraquejavam gradualmente, a ponto de vergarem.
Norberto cresceu para ele, apertou-o pela cintura, e, amparando-o na queda, exclamou:
- Então que homem é o senhor? Tem ânimo ou não tem? Sr. Bernardo, pela alma do seu pai e do seu irmão, não seja fraco! Eu vim aqui para estar com vossa senhoria nesta ocasião, e olhe que nunca mais o deixo. Hei de ir com o meu amigo para toda a parte. A minha pobre ama morreu; mas cá fica o senhor para eu lhe dar toda a minha vida e coração. Sr. Doutor!... então!... Volte a si, e seja forte; que não há remédio senão ter paciência!
Bernardo Moniz não o ouvia. O Calvo, conquanto lhe visse os olhos muito abertos, e sentisse o arquejante respirar de vaporação ardente, apalpava-lhe o coração, receando não lhe ouvir os latejos.