O Retrato de Ricardina - Cap. 23: CAPÍTULO XXIII - A RODA DA FORTUNA Pág. 144 / 178

- Matilde - Rua de S. Francisco, nº 6, Lisboa.

- Vê esta carta, Alexandre... - dizia D. Ricardina ao filho, na volta da Biblioteca.

- Uma carta! É a primeira que lhe vejo receber! Quem conhece minha mãe em Portugal?

Leu, refletiu e disse:

- Quer que lhe saiba quem é esta Matilde?

- Olha cá, meu filho, não te lembras, há seis anos, aquele teu condiscípulo de Viseu contar-te uma história de uma Matilde, que casou com um visconde?

- Lembra-me pouco mais ou menos dessa história; mas nem sei se era Matilde a mulher, nem encontro parentesco nenhum dessa viscondessa da Beira com esta Matilde que lhe escreve.

- Tens razão... - obtemperou a mãe - , tens razão; mas, outra coisa, meu filho, fala-me verdade... Não tens lembrança nenhuma... quero dizer... não terás alguma afeiçãozinha que possa explicar esta carta?

- Eu, minha mãe!... - disse ele cascalhando uma risada. - A minha vida bem a sabe. De dia, leio; de noite, escrevo e durmo. Ninguém conquista corações a lidar com a traça das livrarias dos frades. O deus do amor não ousa penetrar com os seus dardos o arnês das capas encoiradas dos livros que me defendem. Isto, a meu ver... realmente eu não sei o que isto é!... Quer minha mãe que eu vá indagar, não é assim?

- Pois vai logo, meu filho... Sabes tu! Bate-me o coração!...

- É visionária, minha mãe!... Está já a supor que alguma princesa chamada Matilde, e viúva, lhe vem pedir a mão do seu filho!

- Não é isso!

- Pois que maior desgraça lhe palpita! Ainda mais que fazerem-me matrimonialmente príncipe?!... Se lhe parece, minha mãe, jantemos o nosso jantar plebeu e depois romantizaremos à sobremesa.

Instado pela sua mãe, Alexandre foi à Rua de S. Francisco, e passou olhando para os números das portas. A viscondessa reconheceu-o na revolta do Chiado, e escondeu-se incendida, febril de pejo, e doente das convulsões do seio.





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