- Creio tanto que me ama, como creio no seu orgulho. Já tive ocasião de o conhecer...
- Orgulho?! - atalhou Alexandre. - Quererá dizer pundonor de pobre, que é a mais irrisória, se não desprezível, das soberbas? Qual foi o meu orgulho?
- Não sei... A sua memória que lho diga, primo.
Eu que não tive nenhum... Amava-me pobre, Alexandre? Também eu o amei, quando sabia a sua trabalhosa e honrada vida, e lhe não conhecia nome de pai ou mãe. Que me importa? Mas olhe, primo, o que eu sentia não era meu, não era impulso próprio de virtude... Foi Deus que me guiou e deu coragem para escrever a sua mãe. Se Alexandre fosse outro homem, pode ser que eu, se não estivesse perdida no conceito do mundo, o estivesse diante da minha consciência. Mas o que eu fiz, se não obedecesse a um pressentimento providencial, seria próprio do meu carácter? Não, meu primo. Peço-lhe que me não louve nem condene.
O autor da Jurisprudência Hispânica deu férias ao coração, e desairou a ciência dos Bártolos e Cuvarrubias, apertando nos braços sua prima com o virginal estremecimento de que já hoje em dia não há gabar-se donzel de 22 Abris. D. Ricardina chorava de alegria. As faces de Matilde purpurejavam-se, ao mesmo passo que o rir dos olhos estava declarando que o júbilo e o fogo da paixão algumas vezes, por equívoco do colorido, se chamam erradamente pudor.
Há pouco e desnecessário que se diga desde este abraço até às núpcias. Quem disse tudo, naquele ano de 1852, foi a nata social de Lisboa, onde corre que ninguém contende com as vidas alheias. Pois conjuraram as pessoas mais descuriosas em sofismar o parentesco do literato com a viscondessa, anojando-se do inútil e piegas fingimento. Se queriam amar-se e casar-se e delapidar o cabedal do defunto, escusavam de se inventarem primos.