Procurar livros:
    Procurar
Procurar livro na nossa biblioteca
 
 
Procurar autor
   
Procura por autor
 
marcador
  • Sem marcador definido
Marcador
 
 
 

Capítulo 3: CAPÍTULO III – REAÇÕES

Página 17
Às onze, desceu ao jardim e depositou a carta, a ocultas da irmã, debaixo do vaso sobreposto à fonte. Por volta do meio-dia, Norberto recolheu a carta, e foi à hora da sesta pedir a sua mãe que, no dia seguinte, a levasse ao correio de Viseu.

Bernardo Moniz pressagiou desgraça quando reconheceu a letra. Era a primeira carta que ele recebia em Coimbra. Tal ventura nunca ele se arrojara a pedi-la. Sobrava-lhe felicidade, consentindo Ricardina em ler as centenas de páginas que semanalmente apareciam pendentes dos festões do roseiral do mirante. Não queria mais. Nem de tanto, na sua consciência, se reconhecia digno. Leu, releu, quanto as lágrimas lho consentiam. A menina queixava-se da sua sorte; mas não pedia socorro nem atrevimentos de fino amante. Aceitava o convento com preferência a ser esposa de outro. Lastimava o seu amigo como a si própria. Ensinava-lhe a resignação, dando-lhe o exemplo. Queria, porém, que ele não amasse outra, sem ela ter morrido na clausura.

O primeiro pensamento de Bernardo Moniz foi entrar simultaneamente num mosteiro da Arrábida, da Falperra, da serra de Ossa, do Buçaco, de S. Francisco de Viana, num sepulcro bem triste, com a mais pobre das mortalhas. Mas o coração repulsava a morte. A reação da saudade foi tão rija e tão de fogo que os ermos cenobíticos se lhe afiguravam infernos, onde a purificação das almas é hipócrita, quando, ao sair do mundo, o monge não chorou desenganado das suas esperanças. Bernardo, aos 23 anos, ainda não tinha perdido nenhuma.

Cada hora lhe desabotoava do coração rebentos novos a florir e a recender. Não tinha ainda vivido. Era preciso suicidar-se ao tempo que apertasse o cordão de frade como esparto de estrangulação. Não podia. Queria antes morrer debaixo dos olhos dela.

<< Página Anterior

pág. 17 (Capítulo 3)

Página Seguinte >>

Capa do livro O Retrato de Ricardina
Páginas: 178
Página atual: 17

 
   
 
   
Os capítulos deste livro:
CAPÍTULO I - O ABADE DE ESPINHO 1
CAPÍTULO II - UM AMIGO! 9
CAPÍTULO III – REAÇÕES 12
CAPÍTULO IV - BERNARDO MONIZ 19
CAPÍTULO V - MÃE E FILHA 25
CAPÍTULO VI – AGONIAS 32
CAPÍTULO VII - O QUE ELA PEDIA A JESUS 39
CAPÍTULO VIII - O BEM-FAZER DA MORTE 45
CAPÍTULO IX - ATÉ QUE ENFIM! 52
CAPÍTULO X - A SORTE 59
CAPÍTULO XI - MEMÓRIAS DOLOROSAS 66
CAPÍTULO XII – ESPERANÇAS 75
CAPÍTULO XIII - NORBERTO CALVO 80
CAPÍTULO XIV - PLANOS DO ABADE 88
CAPÍTULO XV - COMO O SENTIMENTO DA GRATIDÃO FEZ UM TIGRE 94
CAPÍTULO XVI - E O SOL NASCIA FORMOSO! 104
CAPÍTULO XVII - ENTRE A DEMÊNCIA E A MORTE 112
CAPÍTULO XVIII - O QUE FEZ A IGNORÂNCIA DO ESTILO FIGURADO 118
CAPÍTULO XIX - TÁBUA DE SALVAÇÃO 122
CAPÍTULO XX - OBRAS DO TEMPO 125
CAPÍTULO XXI - VANTAGENS DE CINCO PRÉMIOS 132
CAPÍTULO XXII - OS “DEZ-RÉIS” DA VISCONDESSA 136
CAPÍTULO XXIII - A RODA DA FORTUNA 141
CAPÍTULO XXIV - A NETA DO ABADE DE ESPINHO 147
CAPÍTULO XXV - O CORAÇÃO NÃO SE REGULA PELAS LEIS VISIGÓTICAS 156
CAPÍTULO XXVI - O REPATRIADO 161
CAPÍTULO XXVII - O RETRATO DE RICARDINA 166
CAPÍTULO XXVIII - ENFIM... 171
CAPÍTULO XXVIII – CONCLUSÃO 177