Se não fosse eu, a menina não tinha quem levasse cartas e recados ao Sr. Doutor, não é verdade?
- Foi ele que te deu o retrato? - perguntou com sobressalto Ricardina. - Não lhe pudeste salvar a vida?
- Lá vamos. Primeiro quero que me perdoe andar eu com cartinhas vai e cartinhas vão.
- Sim, meu amigo... - respondeu ela, embargada pelos soluços - , tu eras o nosso anjo bom... Pergunta aos meus filhos o que eu tenho dito de ti, Norberto... Se tu pudesses defendê-lo, Bernardo não seria morto... Nunca perguntaste por mim?
- Perguntei ao Sr. Abade, e ele disse-me: “Essa mulher morreu.” E vai a fidalga não tinha morrido, e eu há vinte e quatro anos a pensar que vossa Senhoria estava no Céu. E ela aqui está! A minha menina está aqui diante dos meus olhos! Eu estou acordado - dizia ele esfregando as pálpebras - , é ela que eu vejo, sem dúvida de casta nenhuma! Ora agora, há de perdoar-me de eu ser um bruto que me fiei no seu pai. Ele disse-me “morreu” e eu fui para Espanha, e... fui dizer... que vossa senhoria tinha morrido... mas a quem? A quem? Veja lá se pode adivinhar.
- A quem foi? - perguntou Ricardina espantada, e ainda suspeitosa do tresvario do velho.
- Ora eu lhe conto... Ó Sr. Alexandre, Vossa Senhoria faz favor de contar a sua mãe o que eu lhe disse? Acho-me cá por dentro atrapalhado... Pensei que podia falar e não posso... Olhe, olhe as bagadas a cair-me nas barbas...
D. Ricardina olhava para o filho.
- Que é? - perguntava a viscondessa ao marido.
- Falo eu, Sr. Norberto?
- Fale Vossa Senhoria, que eu estou afogado aqui na garganta... Bem vê...
- Minha mãe - disse Alexandre, sentando-se no sofá rente com ela e cingindo-lhe o braço pela cintura: - tem ouvido dizer que a felicidade mata mais fulminantemente que a desgraça?
- Pois que é?
- É que a minha mãe tem obrigação de resistir ao choque das alegrias como resistiu às maiores desditas que ainda sofreu mulher alguma.