«Não queria que eu fechasse os postigos nem corresse as cortinas para ver o céu de noite, diz Frieda em Not I but the Wind. - Foi nessa altura que escreveu Apocalipse. Ia-me lendo o que escrevia, e como a sua voz ainda era forte! 'Esplêndido', exclamava eu (...) Quero regressar aos dias antigos, explicava-me, aos dias anteriores à Bíblia e tentar recuperar para nós, homens de hoje, as formas de viver e de sentir dos homens de outrora.»
Começando por uma dúvida essencial - (o doce João do Quarto Evangelho, o favorito de Cristo, o que deitava a cabeça no peito do Mestre, poderá ser este João autor de um vingativo Apocalipse que arrasa o cosmo e promete glórias adiadas a um bando de cristãos eleitos, frustrados por não tocarem de perto as riquezas terrenas?) -, D. H. Lawrence vislumbra um livro pagão muito anterior a Cristo e condimentado pela simbologia cósmica, corroído depois por escribas judeus e retomado por um tal João de Patmos para o trabalho de moldagem pelas conveniências da nova religião, maltratado ainda por apocaliptas tardios que pretenderam ocultar os derradeiros vestígios da sua matriz pagã.
Arqueólogo do Apocalipse, Lawrence revolve palavras, frases, expõe à luz um trabalho de corrupção que oculta uma verdade antiga, dos tempos em que o homem lidava directamente com as forças do cosmo e procurava nelas o sentido da vida.