..»
- Encontra-se um dia - repetiu Rodolphe -, um dia, de repente e quando já não se tem esperança. Então abrem-se os horizontes, é como que uma voz que grita: «Aí está ela!» Sente-se necessidade de fazer àquela pessoa a confidência da nossa vida, dar-lhe tudo! Não há que dar explicações, tudo se adivinha. Já nos conhecíamos nos nossos sonhos. (E olhava para ela.) Enfim, está ali o tesouro que tanto procurávamos, ali, diante de nós; ele brilha, resplandece. No entanto, ainda duvidamos, não temos coragem para acreditar; ficamos deslumbrados, como se tivéssemos saído da escuridão para a plena luz.
E, a rematar estas palavras, Rodolphe acrescentou a pantomina à sua frase. Passou a mão pelo rosto, como quem se sente atordoado; depois deixou-a cair sobre a de Emma. Esta retirou a sua. Mas o conselheiro continuava a leitura do discurso:
«E quem poderia admirar-se de que assim acontecesse, meus senhores?
Unicamente quem fosse suficientemente cego, suficientemente mergulhado (não receio dizê-lo), suficientemente mergulhado nos preconceitos de uma outra época, para desconhecer ainda o espírito das populações agrícolas. Onde, efectivamente, se poderá encontrar mais patriotismo do que nos campos, mais dedicação à causa pública, numa palavra, mais inteligência? E não me quero referir, meus senhores, àquela inteligência superficial, vão ornamento dos espíritos ociosos, mas antes a essa inteligência profunda e moderada que se dedica, acima de tudo, a alcançar objectivos úteis, contribuindo assim para o bem de cada indivíduo, para o melhoramento comum e para a protecção dos Estados, fruto do respeito pelas leis e da prática dos deveres...»
- Ainda mais esta! - disse Rodolphe. - Sempre os deveres, estou cansado de ouvir aquelas palavras.