As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 37: XXXVII Pág. 268 / 332

Oculte-se muito embora a verdade. Não quer sacrificar sua irmã? Compreendo e admiro a nobreza dessa resolução, creia. Mas não posso consentir que uma indesculpável leviandade da minha parte seja a causa desse imenso sacrifício, sem que...

- Já lhe disse que não era imenso; mas que fosse, como queria evitá-lo?

O reitor repetia a interrogação com os olhos.

- Pois não vê que a única maneira, Margarida, é... Eu sei que sou indigno de aspirar a tanto, mas perdoe-me, a única maneira é não me recusar a reparação que lhe devo; permita-me que reúna ao seu o meu destino, já que a Providência...

- Bravo! - atalhou o padre, batendo com a bengala no chão.

- Isso mesmo é que eu tinha aqui dentro a pesar-me; até que enfim respiro!

Margarida estremeceu ao ouvir Daniel, e instintivamente levou as mãos ao coração, como se fora ferida aí. Em poucos instantes, as faces, de ordinário pálidas, passaram-lhe por cambiantes rápidas de cor. Trémula de ansiedade, sentiu vergarem-se-lhe os joelhos e enevoar-se-lhe a vista. Valeu-lhe o apoio de um móvel próximo para não cair. Por algum tempo tentou em vão responder; a voz não lhe saía da garganta.

Daniel olhava-a ansioso. O padre esfregava as mãos, exultando de júbilo.

Afinal, vencendo esta violenta comoção e assumindo outra vez a placidez habitual, respondeu com uma voz onde sem dificuldade se podia descobrir ainda um indiscreto tremor.

- Obrigada. É generoso o oferecimento... mas não posso aceitá-lo.

- Que diz? - exclamou Daniel.

O padre passou do júbilo à estupefacção.

- Pois queria que aceitasse? Aceitá-lo-ia, se estivesse no meu lugar? diga. - Qual será maior martírio: sofrer as murmurações, as injúrias, os desprezos até, de milhares de pessoas, que, afinal de contas, nos são indiferentes, ou aceitar a compaixão de quem nos é.





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