Conteve-se, porém, e, ainda um esforço para se dominar, respondeu, com mal disfarçada indiferença:
- Eu não o esperava, Sr. Fernandinho.
- Não me esperavas! - retorquiu o rapaz. - Então que fazias aqui a esta hora?
- Bem se vê que o senhor desconhece os nossos hábitos, ou pelo menos os meus.
- Não te compreendo...
- Eu lhe explico: nós outras, as raparigas que trabalhamos em casa, costumamos deixar o trabalho logo que a noite começa, e vimos depois descansar um pouco para junto da porta; as que têm conversados esperam por eles e entretêm-se algum tempo a falar-lhes; as que os não têm divertem-se com as raparigas das vizinhanças.
- Visto isso, tu, que não estás a divertir-te com as tuas companheiras, esperas decerto pelo teu conversado, não é assim? - e Fernando proferiu estas últimas palavras, dando à voz uma inflexão de tristeza.
- Oh, meu Deus! - respondeu Rosa em tom magoado. - Pois eu não lhe disse já que não tinha conversado algum?
- Juras-mo, Rosa? - exclamou Fernando com exaltação.
- Que loucura!... Pois que necessidade tinha eu de mentir-lhe?
- Bem, fico satisfeito. Agora cumpre-me satisfazer o teu pedido: aqui tens esta galinhola; foi a única peça de caça que pude hoje matar.
- Ora esta!... Pois o Fernandinho tomou a sério o meu pedido?
- E porque não?
- Mas o que lhe disse foi por simples brinquedo.
- Fosse o que fosse... Aceitas ou não?
- Aceito para não o desgostar.
- Ora ainda bem; estava a ver se, depois de tanto trabalho...
- Então não havia caça? Esforçou-se muito só para me obsequiar?
- Caça havia até de mais; mas eu é que estava de uma infelicidade atroz. Não sei se deva atribuir isso à falta de exercício, se a outro qualquer motivo. O que é certo é que todos os tiros me falhavam, e, se não fosse o teu pedido, Rosa, juro-te que tinha pegado em espingarda e pólvora e atirado tudo para o inferno.