O Retrato de Ricardina - Cap. 10: CAPÍTULO X - A SORTE Pág. 64 / 178

- Que é que te repugna? - insistiu Francisco Moniz - , é matar? Não mates. Vocês são treze. Dois tiros matam dois homens. Outros dois tiros assustam os deputados, catedráticos, que não foram votados à morte. Restam nove homens para conter em respeito os caleceiros. Porque não hás de pertencer aos nove da missão incruenta? Deixa-me sorrir, que não é muito para chorar o caso. Além de que vocês vão mascarados com lenços. Quem há de conhecê-los? Se não entrever desastre imprevisto, espero que vocês entrem cada um na sua casa desassombradamente.

Reanimava-se Bernardo ao compasso das confortadoras e algum tanto facetas razões do médico. O teólogo permanecia triste, cabisbaixo, e sempre enxugando choro, às ocultas do irmão.

- Bem! - disse reanimado o jovem. - Lembraste, Francisco; a intervenção possível de um desastre.

- Sim.

- Conjeturemos que se realiza a péssima hipótese.

- De que modo?

- Que eu sou morto, ou me expatrio para não ir ao patíbulo dos sócios de Gomes Freire.

- Que pessimista!

- Supondo. Vamos conversar tranquilamente. Morto ou fugitivo, deixo ali Ricardina. Que lhe fareis?

- Diz-nos a tua vontade, se queres que persistamos na hipótese péssima.

- A minha vontade...

Demorou-se na resposta, porque os soluços o embargaram.

- A tua vontade - prosseguiu o médico - é que ela volte para um mosteiro?

- Não.

- Pois quê?

- Que digam ao meu pai e a toda a gente que ela era minha esposa clandestina. Se for necessário, falsificareis uma certidão de casamento; dareis muito dinheiro a um vigário que a passe. Isto é possível, meus bons amigos? É possível? - clamava ele, abraçando-os.

- É - responderam simultaneamente os irmãos. - Ricardina irá para nossa casa.

- Respiro, meus irmãos! Agora, perdoai-me as lágrimas e absolvei-me da fraqueza.





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