As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 13: XIII Pág. 84 / 332

- Prouvera a Deus que o fosse... que o seja. Mas, bem vêem, havia em mim muita amargura para me ser suportável a vida. Se o travor nos está nos lábios, não há doçura de mel que o disfarce. Vergava pois sob o peso da existência. Pedia fervorosamente a Deus, que me tirasse deste martírio, e era sincera a prece, era! Persuadia-me eu que, ao ouvir bater a minha última hora, a saudaria com júbilo; e agora que bem sinto que chegou..., e chamam-me forte ainda! agora, ao ouvi-la, assusto-me, estremeço... Está próximo a revelar-se o mistério...

e que segredos me descobrirá? Que verá minha alma ao rasgar- se a nuvem, que caminha diante dela? Que verá minha alma depois do túmulo? Que verá minha alma no dia de amanhã?

- A glória eterna, a bem-aventurança do céu! - respondeu o reitor com a firme convicção da fé.

O velho Álvaro fitou nele um olhar demorado e perscrutador, e depois, escondendo o rosto entre as mãos, exclamou quase soluçando:

- Senhor! Senhor, porque me negais o bálsamo de uma crença como esta!

O reitor contemplava-o com olhos de piedade. Para a sua alma, ingénua e sinceramente cristã, era desconhecida e quase inconcebível esta excitação febril, a que certa ordem de meditações arrebatam alguns espíritos ilustrados. A dúvida, esse demónio inquietador, nunca dirigira às suas crenças piedosas a interrogação fria e implacável, que as faz estremecer. Elas protegiam-lhe ainda, como dantes, a cabeceira do leito contra os maus sonhos dos filósofos e, alumiado pela sua luz, achava-se também o bondoso pároco no fim da viagem da vida, sem se lembrar de perguntar a que porto chegaria.

Sabia-o, de pequeno; desde então lhe repetia o nome de contínuo.

Como que já aspirava as auras desse país, e às vezes quase se iludia a ponto de o julgar entrever.





Os capítulos deste livro