- Ao findar o dia, gostava eu de me ir sentar lá fora, a ver descer o Sol; mas, dentro em pouco, tomava-me de uma tristeza profunda e rompia em lágrimas, que não podia estancar. Aquele descimento do Sol lembrava-me outros ocasos. Eu tenho visto tantos! Um dia, em volta de mim, apagaram-se os esplendores da riqueza. O meu coração era de homem..., padeceu, mas Deus sabe que não foi para ele esta a prova mais terrível. Outro dia apagou-se a luz da vida no olhar de uma esposa adorada; outro, nos rostos de duas crianças inocentes, que, ainda a morrer, me sorriam; então sim, fez-se a noite em minha alma... Era isto que me recordavam aqueles ocasos...
- Mas então para que procurava essas ocasiões de tristeza, diga? - perguntou Margarida com afabilidade e quase sorrindo. - Olhe; se às mesmas horas se voltasse para o outro lado, para aquele, onde o Sol nunca se vai esconder, nem as estrelas, havia muitas vezes de avistar a Lua que subia, a Lua que não deixava que a sua noite fosse escura de todo. Também ela o afligiria assim?
- Também ela. Às vezes a vi. Lembrava-me então que, para mim igualmente, ao apagarem-se as ardentes afeições do meu coração, nasceu a luz do teu afecto, melancólica e suave como a dela, Margarida; entristecia-me com a lembrança.
- Porquê? - perguntou Margarida.
- Porque, tentando descobrir a força misteriosa que te aproximava da minha desventurada velhice, a ti, a quem, pela idade, só alegrias deviam atrair, encontrava apenas a explicá-lo a tristeza dessa alma, tristeza que é o segredo do teu coração, que a ninguém revelas, e Deus queira que não acabe por te devorar um dia.
Margarida desviou os olhos da vista fixa e penetrante do velho, e respondeu, fingindo sorrir:
- Pois então, desta vez, meu bom amigo, era bem sem razão, que se entristecia.