As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 29: XXIX Pág. 201 / 332

um lobisomem; as raparigas acotovelavam-se, cochichavam umas com as outras, sufocavam os risos e olhavam às furtadelas para Daniel; porém não houve quem se afastasse para dar lugar; antes se apertavam mais uns contra os outros, como para evitarem a vizinhança.

Daniel repetiu a reclamação e, ao mesmo tempo, corria com os olhos as diferentes figuras, ali reunidas, como a procurar aquela cuja proximidade mais agradável lhe pudesse ser.

O tácito indeferimento do seu pedido continuava, porém. Os risinhos mal abafados, as murmurações a meia voz e o som do esfolhar das espigas, tarefa em que todos pareciam com dobrada von- 190 tade empenhados, era o que se ouvia, em seguida à requisição que ele pela segunda vez fizera.

- Então que é isso? - dizia José das Dornas meio a rir, meio despeitado. - Que diabo! Não haverá aí lugar para mais um?

Olhem que o rapaz não está empestado.

Houve um movimento geral como para conceder o lugar requerido, movimento simulado porém, que, longe de abrir brecha no círculo, antes mais o estreitou.

Daniel principiava a preparar-se para conquistar o terreno, que lhe negavam, e com esse intuito fitava já um espaço entre duas galantes raparigas, que naquele momento falavam ao ouvido e riam, quando escutou a voz de Clara, que lhe dizia do outro lado da eira:

- Venha para aqui, Sr. Daniel, se lhe agrada a companhia.

E, arredando-se de uma velha meio mouca e cega que tinha à direita, Clara ofereceu a Daniel o lugar que ele pedia.

A este não desagradou a colocação e apressou-se a tomar assento, junto de sua futura cunhada.

Uma tal solução foi para todos satisfatória - a não termos de exceptuar talvez muitas das raparigas, que mais repugnância tinham mostrado em conceder junto de si o lugar pedido, mas que não desestimariam vê-lo usurpado - contradições de natureza essencialmente feminina.





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