- Então, rapariga? Qual foi dos nove? Diz lá. Tu que te queixaste é que algum embarrou por ti.
- Eu não me queixei... - murmurou a interrogada.
Verdadeiramente ela não se queixara. Foi o Zeferino, o filho do alferes da lamela, o mestre-pedreiro que andando a construir um canastro na eira do padre-mestre, observara que os estudantes rentavam à cachopa, e ajeitavam-se em atitudes abrejeiradas, como de quem espreita, quando ela subia a escada.
O denunciante ao pai de marta foi ele, o pedreiro abastado, não porque o espicaçassem nessa denúncia o zelo dos bons costumes, e um justo ódio às concupiscentes espionagens dos rapazes, mas porque gostava, deveras, da jovem. Ele passava já dos trinta e dois e era a primeira vez que sentia no coração as alvoradas do amor. Frei roque, averiguado o caso, advertiu o pedreiro que não fosse má-língua, que não andasse a difamar os seus discípulos, que se preparavam para o sacerdócio - uma coisa séria. O episódio acabaria assim menos mal, se dois dos estudantes, que se preparavam para o sacerdócio, mais fortes no fueiro que nas conjugações, desistissem de o moer a pauladas, uma noite num pinhal. O mestre-de-obras iniciou-se pelo martírio obscuro num amor que começava bastante mal. Ele nunca soube ao certo quem lhe batera, e atribuiu a sova a émulos na arte, covardes e misteriosos, por causa da construção de uma igreja que ele desdenhara, citando as regras do Vignola. Vinha a ser o desastre uma tunda por motivos de arquitetura - um martírio de artista. Invejas. Por causa da arte padecera o seu colega Afonso Domingues, o arquiteto da batalha, e João de Castilho, o do convento de tomar, e já tinha padecido seu mestre, o Manuel chasco, a quem inimigos quebraram a cabeça na feira dos 21, porque ele, desfazendo na obra de um colega, dissera que o botaréu de um cunhal estava torto.