Credo!
A tia maria era muito rezadeira, erguia-se de noite para não pender a sua missinha no verão ao romper do dia, e garganteava com uma melopeia fanhosa a via-sacra na quaresma, à volta da igreja; presenteava os santos dos altares com os mimos da sua lavoura, que se leiloavam ao domingo no adro, dava cama e mesa untuosa aos missionários, confessava-se todos os meses, e sentia pelas suas vizinhas menos beatas o inefável prazer de afirmar que tinham de cair vestidas e calçadas no inferno. O filho penetrou-se de uma ideia trivial a respeito da sua mãe: - que os sentimentos religiosos a levariam a dar o consentimento, se marta cometesse um desses pecados que se remedeiam com o matrimónio. O padre Osório dizia-lhe que a intenção era honesta, mas o expediente mau. Não lhe citou teólogos nem preceitos de origem divina. Argumentou-lhe com a hipótese da pertinaz resistência da mãe. Que não esperava nada da sua religião um hábito de trejeitos de mãos e de beiços, o automatismo idólatra dos selvagens da américa, que davam guinchos mecânicos, prostrando-se por terra, quando ouviram a primeira missa; que a religião das aldeias, sobre a dos indianos da catequese dos jesuítas, as vantagens que tinha era a hipocrisia em uns, e o fanatismo em outros, quando não se jantavam ambas as coisas nos mesmos fiéis, o padre Osório paroquiava e conhecia o seu rebanho, joeirando-o pelos crivos do confessionário. Não conhecia menos a tia maria de Vilalva. Afirmava que a fragilidade de marta seria para a velha mais um motivo de ódio e desprezo; porque, na sua cartilha e nos ditames dos seus diretores espirituais, não se lia nem ouvia que a mãe devia encobrir a desonra de uma rapariga casando-a com o seu filho, sedutor dela.
As reflexões do vigário de Caldelas eram ótimas, mas extemporâneas.