Seguiram-se horas de insónia. O juízo dava-lhe tratos amaríssimos ao coração. O homem sentava-se na cama, e remexia-se inquieto como se o escárnio o estivesse picando de entre a palha do enxergão. Os intervalos lúcidos eram-lhe intervalos do inferno. Os axiomas clássicos sobre o amor caíam-lhe na memória como chuva de dardos. Quem mais o suplicou foi o mestre e amigo D. Amador Arrais. Este santo bispo apresentou-se-lhe em visão, com D. Teodora Figueiroa ao lado, e disse-lhe as palavras do capítulo XLV dos Diálogos: «Em a lei de Cristo a fidelidade que deve a mulher ao marido, essa mesma deve o marido à mulher; e, se as leis civis dão mais poder aos maridos que às mulheres, não é para as ofender e maltratar, nem para um ter mor jurisdição sobre si que o outro.»
Seguiram-se outras visões de não menos pavor. Aí pela madrugada, Calisto Elói amodorrou-se em roncado dormir; mas a fada que lhe abrira os tesouros virgíneos do coração, a esbelta Adelaide, bateu-lhe com as asas brancas nas pálpebras, e o homem acordou estrovinhado a desgrudar os olhos, que se haviam fechado com duas lágrimas, as primeiras que o amor lhe esponjara do seio, e cristalizara nos cílios, como diria o Dr. Libório.
Então foi o trabalharem-no umas cogitações tão sandias, que seriam imperdoáveis, se não estivessem na tresloucada natureza de todo o homem que ama.
Entrou a inventariar as alterações que devia fazer no substancial e acidental da sua personalidade.