Só, na presença das duas senhoras, deitou Daniel ombros à empresa de distrair a menina Francisca.
Entre outras muitas coisas afirmou, por sua conta e risco, que as belezas célebres, essas que inspiraram os grandes poetas, os grandes artistas, e os grandes amores, tinham sido trigueiras e, especificando, citou: Dido, Natércia, Cleóprata, Beatriz, Fornarina, Laura, Inês de Castro, etc., etc. Desta gente toda, a Sr.ª Teresa e sua filha só conheciam Inês de Castro, porque havia meses que tinham visto representar uma obra dramática, produção inédita de não sei que Shakespeare rústico, na qual entrava esta senhora, mais maltratada ainda das mãos do trágico, do que das dos «brutos matadores».
A mãe fez notar à filha que de facto não era das mais alvas a moçoila, que desempenhou a parte da heroína daquela vez.
Além destes argumentos histórico-apologéticos, a respeito da cor trigueira, Daniel, aproveitando uma curta ausência da Sr.ª Teresa, segredou à menina algumas amabilidades de efeito salutar.
Ela teve a condescendência de sorrir.
Diga-se a verdade: nunca até então escutara também mais gentil conforto contra o motivo das suas penas.
Daí até ao fim da entrevista foi toda sorrisos.
Daniel, quando saiu, ia muito bem conceituado pela parte feminina da família e prometeu voltar.
João da Esquina conservava-se ainda um pouco frio.
De mais a mais, quando Daniel passou pela loja, a Sr.ª Teresa, que era para com ele de uma amabilidade monstruosa, disse para o marido:
- Toma arsénico, João; que teima a tua em não tomar arsénico!
Esta insistência produziu calafrios na espinha dorsal do tendeiro.
- Ó mulher, não me digas isso! Que cisma! - exclamou ele irritado.
Na noite desse dia, pela primeira