As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 24: XXIV Pág. 162 / 332

Esgotado este pecúlio literário, lembrou-se Daniel de escrever cartas. Encontrou porém o tinteiro muito pobre de tinta; essa, amarela e bolorenta; e, pior que tudo, uma pena de pato de tantos caprichos, que lhe fez perder logo a paciência.

Veio para a janela e, durante algum tempo, divertiu-se a atirar biscoitos a um cão, que andava solto pela quinta. As galinhas, patos, pombas e perus, que havia em abundância na casa, corriam tumultuosamente a disputar ao quadrúpede as migalhas, as quais ele defendia com unhas e dentes.

Este jogo de circo, em miniatura, encantava Daniel. Afinal cansou- se dele também e fê-lo cessar.

Vendo então um gato em pachorrento repouso, no alto de uma ramada distante, tomou um espelho e, por meio dele, fez cair sobre a cabeça do sonolento animal os raios ofuscadores daquele sol de Agosto.

O gato, assim despertado, abriu os olhos, mas fechou-os logo, e desviou a cabeça para se furtar àquela pouco agradável impressão.

Depois de vários movimentos, sentindo-se sempre perseguido pelo mesmo reflexo, ergueu-se, espreguiçou-se, aguçou as unhas na madeira da ramada e, voltando-se para o outro lado, ajeitou-se, com o manifesto intento de concluir o sono interrompido.

Impossibilitado, por esta evolução do gato, de continuar a incomodá-lo da mesma forma que até ali, Daniel fez-lhe pontaria com uma maçã verde, e tão certeira, que o projéctil foi bater em cheio nas costas do animal, que num salto desapareceu.

Terminou para Daniel mais este divertimento.

No peitoril da janela, descobriu porém uma formiga. Uma formiga! Que valioso achado naquelas alturas!

A providência dos desocupados velava decerto por ele.

Procurou logo uma migalha de pão e pô-la na passagem do laborioso insecto.





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