De repente o reitor, como se lhe acudira uma ideia imprevista, disse, fitando os olhos em Daniel e em tom que procurou fazer natural:
- É verdade, ó Daniel, então você tem casamento contratado e não dá parte à gente?
- Eu?!... Casamento!... - exclamou Daniel, deveras admirado, e sentando-se no leito.
- Casamento, sim. Ainda agora mo asseguraram.
- E quem é a noiva que me destinam?
- Uma vizinha sua. É aqui a filha do João da Esquina.
- Ah! isso sim - disse Daniel, sorrindo e deitando-se outra vez.
- Isso sim? Não leve o caso a rir, que o negócio é muito sério.
Porventura não haverá fundamentos para a notícia que me deram?
- Eu tenho ido a casa dela, é verdade.
- Ah!
- Mas... como médico...
- Não está má medicina, a sua! Então que tratamento lhe aconselhou?
- Confortativo - respondeu Daniel, gracejando.
- Ah! e o boticário entenderia as receitas que escreveu?
- Nem todos os conselhos médicos precisam do auxílio do boticário.
Os banhos de mar, os passeios, os leites de jumenta e as diferentes prescrições do tratamento moral, por exemplo.
- Estou vendo que foi um tratamento moral o que fez.
- Exactamente.
- Olhem que cegueira a do João da Esquina, e a de seu pai e a minha até, que não vimos que era uma carta de guia para bom caminho, uns mandamentos para a salvação do corpo e não sei se da alma também, o que ainda há pouco lemos!
- O quê? Pois leram?... - perguntou Daniel com vivacidade e erguendo-se outra vez.
- Lemos, sim. Mas não entendemos. Veja lá: a mim pareceu- -me aquilo uma coisa desaforada; e ao João da Esquina, então?
Esse não descansou enquanto não teve de nós a promessa solene, de que o obrigaríamos, a si, a uma reparação.