É teu costume. Eu sei. Depois, certa maneira de falar... certo acanhamento... e as lágrimas de há pouco... e as palavras de agora... e essa má vontade com que estás... e esse olhar que se não atreve a levantar-se para mim... é certo, ama-lo; e por isso pergunto: porque recusaste o seu oferecimento?
Margarida conservou-se por algum tempo silenciosa. Depois, por uma destas resoluções, que são raras em caracteres como o dela, mas enérgicas quando chegam a formar-se, disse com uma espécie de desespero, revelando nas palavras, no gesto, nos movimentos, e tomando com ímpeto as mãos da irmã, que apertou convulsivamente nas suas:
- Porquê? Queres sabê-lo? Porque o amo. Entendeste agora?
- Não - respondeu Clara que, surpreendida por aquela exaltação, não podia desviar os olhos do rosto de Margarida.
- Pois não vês, criança - continuou esta - não vês, louca, que seria um martírio horrível, um tormento, que nem se imagina, aceitar a compaixão do homem, a quem se ama? Saber que só para generosamente nos salvar a reputação, só para isso, ele nos fez o sacrifício do seu futuro, das suas ambições; que se baixou condoído, para do chão nos levantar até si! Há lá nada mais doloroso! Dize, desejas-me esse martírio? Conheces o coração da tua irmã, dizes tu; e pensas que ele não estalaria de angústias? E depois, se fosse só isso! mas, quem sabe? Um dia talvez entraria uma suspeita naquela alma; se a delicadeza fechasse os lábios, lá estava o olhar talvez a revelar-lhe o pensamento secreto de que tudo isto em mim fora um propósito interesseiro e vil, de abusar dos seus brios... Ai, Clara, e cuidas que eu resistiria a esta ideia? Cuidas que eu teria coragem para... Oh! deixa-me, deixa-me; fizeste-me já dizer o que eu nem a mim mesma dissera ainda.