Fizeram-se por isso desentendidos.
- E quem vê aquilo então! - disse João da Esquina. - Toda de mantos de seda, toda Santo Antoninho onde te porei.
- Tentações do inimigo mau, sabem? Tentações do inimigo mau, e é o que é. Não que dizem que não serve de nada confessar- -se a gente a miúdo e rezar as orações dos missionários...
- Ai, serve para livrar de maleitas depois da morte - respondeu, já em voz alta, a Sr.ª Joana, preparando-se para sair.
A beata, fingindo não entender, continuou:
- Ainda esta manhã o padre José...
- Oh! - disse expressivamente a criada de João Semana, já da porta.
A beata fitou nela os olhos chamejantes de cólera. Aquela interjeição irritara-lhe os nervos.
- A Sr.ª Joana tem alguma coisa que dizer do Sr. Padre José?
- E você que lhe importa? - retorquiu-lhe Joana embespinhada, voltando para dentro.
- Eu sempre queria saber...
- Ora meta-se com a sua vida, que não é de muitas canseiras, e não tome tanto fogo pelo que se passa nas casas alheias. Não está mau o descoco! Olhem agora o estafermo.
- Não se zangue, Sr.ª Joana; lembre-se que a ira é o quarto pecado mortal.
- Dê conselhos a quem lhos pedir, que eu, quando precisar deles, sempre hei-de ter, graças a Deus, outras barbas melhores que as suas, para mos dar.
- Presunção e água benta, cada qual toma a que quer - disse a beata, com um sorriso de sarcasmo.
O nariz da Sr.ª Joana afogueou-se de vermelhidão, sinal de borrasca iminente.
- Ó Sr.ª Zefa da Graça, repare bem com quem se mete. Olhe que eu não sou da sua igualha, para tomar comigo esses ares de confiança. Veja que lhe pode sair caro o risinho.
- Ninguém falava com a Sr.ª Joana. Quem não quer ouvir as coisas...
- Então, então, isso não vale nada - disse, intervindo pacificamente, a mulher de João da Esquina.