- Espera, onde vais tu com tantas pressas? Então não se te alegra o coração com estes espectáculos?
- Alegra, alegra... mas os meus oitenta anos é que são de mais para a alegria dos noivos. Eu, tu e José das Dornas devíamo-nos retirar, porque eles estão agora persuadidos que nunca envelhecem nem morrem, e nós estamos aqui a bradar-lhes com os nossos cabelos brancos: Memento... et cae tera, et cae terá. Diz tu o resto do latim, se quiseres.
- Isso era bom se eles se lembrassem de nós. Mas parece-me que nem deram por ti ainda. Demora-te pois, João, demora, que me hás-de acompanhar, e mais ao José das Dornas, em uma saúde aos noivos.
- Pois vá lá - respondeu João Semana - ainda que saúdes aos noivos, feitas por velhos... Sabes o que dizia o prior de S. Domingos?
Não podemos saber o que era, porque João Semana disse-o só ao ouvido do reitor, o qual não pôde suster o riso, ainda que, com um gesto de má vontade, observou ao jovial clínico:
- Valha-te Deus, homem... quando te deixarás dessas histórias?
E o reitor, usando da familiaridade que tinha em casa, foi, ele próprio, buscar a garrafa e os copos, para a saúde combinada.
Neste ponto, ouviram-se passos apressados na escada, e à porta da sala assomou a figura ofegante da Sr.ª Joana, a quem não sofreu o ânimo, que não viesse procurar Margarida.
Encontrando tanta gente na sala e o seu amo incluído no número, a boa mulher parou embasbacada.
- Aí vinha outra às vozes, como tu - disse o reitor a João Semana.
- Você que faz por aqui, mulher? - perguntou este à criada.
- Eu?
E Joana não sabia o que dissesse.
- Esturro tenho eu hoje no arroz - disse João Semana, rindo.
- Não há-de ter, se Deus quiser.
Clara correu a Joana e abraçando-a com alegria, disse-lhe:
- Fez bem em vir.