A Queda de um Anjo - Cap. 11: Capítulo 11 Pág. 58 / 207

Não sei quem lhe dissera a ele que o Sr. D. João IV, nas doenças graves, se medicava com um veterinário.

Ora, deste começo de amores, infiram, senhores, o restante daquela doce vida!

Teodora tomou a cargo os cuidados domésticos de sua sogra, e muitos do trato com caseiros, vendo que o marido, tirante as horas de comer, não saía da livraria onde a mulher, como amável sombra, o ia visitar, e, olhando com desdém sobre os in-fólios, dizia-lhe:

— Ó homem, ainda não acabaste de ler esses missais?

— Isto não são missais, menina. Não estejas a profanar os meus clássicos.

A esposa não entendia isto, e pedia-lhe que lhe lesse pela vigésima vez as Sete Partidas de D. Pedro. E o bom marido lia-lhe pela vigésima vez as Sete Partidas, porque estavam escritas em português de lei.

Vida para invejar! Paraíso em que Deus se esqueceu de mandar o anjo do montante de fogo vedar a entrada!

Discorreram anos, sem que o morgado tivesse de perguntar à sua consciência a explicação do mínimo alvoroço de sangue na presença de mulher estranha. Andava por feiras, quando a mulher o mandava comprar utensílios agrícolas; pernoitava por diversas casas da província, famosas pela beleza das donas, e contava-lhes casos miríficos de suas leituras, se acontecia não achar livro velho que lhe deliciasse o serão.

Da maior, e talvez única dor literária da sua vida, fui eu causa. Calisto, pernoitando em não sei que solar de damas dadas à leitura amena, pediu algum livro, e deram-lhe um romance meu.





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