As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 37: XXXVII Pág. 263 / 332

Estavam elas exercendo no seu coração o efeito de bálsamo salutar.

Margarida, depois de breve pausa, prosseguiu, como deixando- -se levar pela corrente dos pensamentos e, falando mais para si do que ainda para as crianças, que a escutavam:

- Cada alma perdida, que se arrepende, é uma vitória do nosso anjo da guarda sobre o espírito do mal. A paixão, que nos trazia cega, deixa-nos enfim, e calcamo-la então aos pés como aquela Nossa Senhora da Conceição faz à serpente tentadora. E nunca é tarde para o arrependimento. Quem caminhasse com os olhos tapados para o despenhadeiro, podia salvar-se ainda, abrindo-os junto da borda. Junto? às vezes até um ramo, a que nos seguremos na queda, nos pode salvar. A fé na misericórdia de Deus é como este ramo. Seja o arrependimento sincero e um olhar do Senhor nos amparará. Uma oração bem sentida, bem de alma, à borda do túmulo, pode chamar sobre uma vida inteira de pecados a luz do perdão divino.

Margarida dissera estas palavras pausada, serenamente, e com tanta unção religiosa, que Daniel sentiu-se comovido. Olhou para o reitor, viu-o atento, imóvel; o padre parecia estar escutando ainda aquela voz, que o prendia, como se pregasse doutrina nova e diversa da que tantas vezes ele próprio proclamara do altar à leitura dos Evangelhos.

Daí a alguns instantes, Margarida despedia-se das suas pequenas discípulas com um beijo e uma palavra afectuosa para cada uma.

Seguiu-se o rumor que elas faziam ao saírem tumultuosamente e depois o silêncio.

Margarida ficara só.

- Agora chegou a nossa vez de sermos doutrinados - disse o reitor para Daniel. - E esteja certo que é sã a doutrina que vier daquela boca.

Aproximando-se da porta de comunicação entre as duas salas, abriu-a de mansinho e disse, metendo a cabeça pela abertura:

- Licença para dois.





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