As Pupilas do Senhor Reitor - Cap. 42: XLII Pág. 326 / 332

- Margarida - disse Daniel com timidez - venho renovar um pedido, que ontem lhe fiz aqui mesmo e que já hoje lhe repeti; peço-lhe...

- Ai pois ele já?... - disse José das Dornas para o reitor.

- Já, já, mas cala-te, homem - respondeu este, ansioso por ouvir a resposta da sua pupila.

Durante esta interlocução dos dois, havia Daniel acabado de formular o seu pedido.

Margarida ficou por algum tempo silenciosa. Ergueu lentamente os olhos para Clara, viu-a pálida e notou-lhe no rosto um ar de firmeza, que a assustou. Conheceu que era inabalável a resolução, que ela formara. Margarida dirigiu-lhe ainda um gesto de súplica; Clara respondeu-lhe com um movimento de recusa, ambos tão rápidos e tão subtis, que só por ambas podiam ser percebidos.

- Então... minha filha? - disse, quase a medo, o reitor, já pouco tranquilo com a hesitação de Margarida.

Enfim, com voz trémula e mal percebida, ela respondeu:

- Que direito tenho eu de recusar uma proposta... tão... generosa? Aceito.

Na maneira de dizer aquele - generosa - ia toda a censura.

- Ainda bem! - exclamaram os presentes, menos Daniel, porque este apoderara-se da mão de Margarida e, apertando-a na sua, beijou-a com paixão.

Margarida estremeceu e... - vão lá agora acreditar na firmeza do coração humano, quando jura cerrar-se às branduras do sentimento e às explosões da paixão! - e, por um desses movimentos irresistíveis, por uma dessas resoluções, com que se dá no amor o passo tremendo e decisivo das confidências, correspondeu a Daniel, apertando-lhe também a mão.

Neste momento passou na rua uma rapariga, cantando:


De pequenina nos montes
Nunca tive outro brincar.
Nas canseiras do trabalho
Meus dias via passar.

Daniel olhou para Margarida, que desta vez não desviou também o olhar.





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