A Queda de um Anjo - Cap. 21: Capítulo 21 Pág. 115 / 207

Sarmento, com delicada liberdade, observou a preponderância que os costumes de Lisboa iam actuando sobre o ânimo do seu bom amigo. Sentiu que os ruins exemplos vingassem quebrantar aquela admirável singeleza de trajo e maneiras que o morgado trouxera da sua província. Lamentou que, em menos de três meses, o modelo do português dos bons tempos se baralhasse com os usos modernos e viciosos.

Calisto Elói defendeu-se froixamente, alegando que as mudanças exteriores não faziam implicância às faculdades pensantes; e ajuntou que, ciente de que tinha sido incentivo da mofa entre os seus colegas, à conta da simpleza um tanto anacrónica dos seus costumes, entendera que a prudência o mandava viver em Lisboa consoante os costumes de Lisboa, e na província, segundo o seu génio e hábitos aldeãos. Concluiu dizendo que: Cum fueris Romam, Romae vivito more, e que o fazer-se singular importava fazer-se ridiculoso; e que os seus anos não eram ainda bastantes para autorizarem a distinguir-se no mero acidente dos trajos.

Perguntado por que deixara de tomar rapé, costume indicativo do homem pensador e estudioso, respondeu que alguns escritores modernos atribuíam ao amoníaco, parte componente do rapé, o deperecimento das faculdades retentivas, pela acção deletéria que o poderoso alcali exercitava sobre a massa encefálica. Além de que a fumarada do charuto, sobre ser purificante e antipútrida, dava aos alvéolos solidez, e consistência aos dentes.





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