Se tivesse elos a cadeia da felicidade humana, o último, a máxima perfeição, havia prender com os gozos celestiais. Esse último elo não o há; se existisse, o morgado, naquele instante, perderia a consciência desta vida, e entraria na exultação beatífica dos anjos.
A fortuna dos corações que desbordam da felicidade no amor deve ser aquela Fortuna parva, à qual Sérvio Túlio erigiu templos. Tito Lívio, a meu ver, toma o parva no sentido de baixa ou pequena; eu traduzo latamente «fortuna lorpa», porque não conheço quem, nuns lances análogos ao de Calisto, mantivesse a inteireza de sua razão e espíritos. É que o morgado não disse coisa que mereça escritura, ele que tão donosamente, em supremos apertos, face a face do Dr. Libório, tirou da veia copiosa repuxos de eloquência!
No dia seguinte, quando as aves abraseadas do sol das onze horas se embrenhavam nos tufos das ramagens, lá estava Vasco da Cunha debaixo da árvore.
À mesma hora, Calisto Elói circuitava a parede da mata em que se emboscava o religioso mancebo, saltava de manso, e quase a súbitas passava rente dele ombro a ombro.
Vasco não conheceu o homem que o fitava com sobranceria. Três meses antes se havia encontrado em casa do desembargador Sarmento com um Calisto que não tinha que ver com aquele homem.
Sorriu-se o morgado, e disse-lhe:
— Costuma V. Exa. intermear as suas novenas com a oração mental nas brenhas e florestas, à imitação dos antigos padres? Ou está pedindo aos deuses infernais que lhe levem a alma da tia, e lhe deixem o vínculo da mesma para poder maridar-se com a Sra. D. Adelaide Sarmento?